Fernanda Nunes
2 min readAug 7, 2023

It’s a competition, baby

O cenário é bem feito: num ambiente completamente controlado e dominado por homens, ela até que conquistou seu espaço. Se diz independente, coitada. O mundo está sob seus pés apenas por uma questão gravitacional, ainda que ela ache que está tudo sob controle.

Quando a paixão vem de forma arrebatadora, ela até chegou a pensar que seria um sentimento machista. Gostar espontaneamente de homem? Nesta economia? Mas deu uma chance, afinal, nem todos são iguais - e não são mesmo. Esperta como ela diz, a mulher até demorou para dar confiança a ele, pois homem. Macaca velha das informações sobre segurança feminina, ela quis saber quem ele era, de onde veio, se vale a pena, se é bolsominion, se lava o cu... Quando percebeu que dali não sairia algo de ruim, deu chances. Uma, duas, três, quatro, que eram recíprocas, verdadeiras, felizes.

Nessa troca, ela se sentiu livre de ser quem é. Ganhou confiança para se vestir, se portar, viver mais. O que de certa forma era uma contradição pois, se era tão feminista, foi se sentir bem só agora?

Ela precisava da validação de um homem de estimação pra dizer: vai, o mundo é seu. Eu deixo.

Sem ele falar, ela foi. Entendeu que amor era aquilo. Aconchego e paz.

Mas a felicidade é como água, não tem como controlar. Ela ia transbordar e foi o que aconteceu. Se sentia em paz e bem, e nessa troca de tudo que chamamos de relacionamento, ela deu a ele sua melhor versão.

Não que ele não tenha gostado, só achou demais. Muito livre e sabida demais pro gosto do moço. E num súbito quase que instantâneo e natural, o rapaz trata de colocar suas ferramentas mais sutis na mesa: comentários soltos sobre o comportamento dela, risadas debochadas, sorrisos pra demonstrar vergonha que ela faz as "pessoas" passarem, sobreposição de conversa pra mostrar que não, ela não entende tanto das coisas assim. Até um apelido ele vai inventar pra moça, no começo será fofo porque é uma brincadeira, depois vai tomar uma outra forma porque, né? Ela só faz merda!

E o que a mulher faz? Não entende de começo. Ué, mas como assim?! Tava tudo bem e justo quando ela se sente mais à vontade não está mais? O que aconteceu?

Ele percebe que ela percebe. Mas ambos sabem que, no fim do dia, a burra é ela. A incapaz é ela, nunca ele. O erro, no fim do dia, vai ser sempre ela - por desatenção, falta de prática, desinformação ou porque é uma tonta mesmo. Já ele, pobre coitado, está aprendendo a viver. Homens são assim, né?

E ela? O que sobrou quando ela permite viver isso? O que a falta pra gritar quando ela quem é silenciada? É o medo do escândalo ou de ser louca pra não corroborar com a ideia perfeita em que são construídas as histórias para que, sob qualquer manifestação emocional, a mulher é exagerada?

Do que a gente tem medo? Se nesse jogo não há jogo para nós?

Fernanda Nunes

na maioria das vezes, os textos vêm quando vou dormir